GRUPO QUESTÕES DE GÊNERO
Apresenta: GARIMPANDO MEMÓRIAS
AS PERSONAGENS PRINCIPAIS
Marli - A cuidadora
Catarina - A esperta taquigrafa
Karin - A perguntadora
Rosa - A observadora
Rafaela - A menina que se balança
Joseane - A menina que ri
Liliane - Aquela que erra e lhes apresenta essa história
COADJUVANTES
Fernando - O companheiro
Valdir - O motorista / homem sensual
Ronaldo - O gaiteiro
CONVIDADAS ESPECIAIS
Neiva - A mulher que gargalha
Laudi - A bordadeira
Celina - A professora
Josefa - A visitante inesperada
Claquete – Ação!
ATO Nº 1 - 12 de setembro, dez horas e trinta minutos.
As personagens seguem rumo a Monte Castelo,SC para conhecer outras personagens que serão provocadas a presenteá-las com suas memórias de mulheres.
A cuidadora espera junto com a menina que se balança. Seu companheiro está junto. Preparam um banquete para receber as personagens. O companheiro da cuidadora aceita docemente o papel de coadjuvante que sabe ser importante, sem interferir.
O banquete é servido junto com sonhos e risos. Fotos. É preciso preservar o instante. Guardá-lo para sempre dentro e fora da memória.
Seguem guiadas pelo homem sensual que lhes dirige pelos caminhos da garimpagem de memórias. Percorrem pequeno trecho do caminho de volta para chegar a casa da mulher que gargalha.
ATO Nº 2 - Na casa de Neiva – a mulher que gargalha
Cheiro bommmmmmmmmm.... Bolachas feitas em casa para vender na pequena VENDA na frente da casa.
1ª. parada para fotos e se inundar do cheiro.
2ª. parada para admirar a máquina que expele tirinhas de bolachas que são cortadas com uma espécie de guilhotina com 8 laminas. Máquina bacana! Invenção do filho que não a patenteou, mas permitiu que alguém fotografasse para divulgar na internet! Confiança ou ingenuidade?! Coisas de quem não conhece o valor de sua própria criação para além de sua necessidade.
3ª. parada. Em volta da mesa. Cadeiras e banquetas diferentes. Copos variados para o refrigerante generosamente oferecido. Fotografias tiradas pelas personagens e pelo filho que depois segue em direção ao Banco.
Uma pergunta: de que família a senhora é?
Surpresa! Parentes conhecidos. Um amigo querido dessa que lhes apresenta essa história. Mundo pequeno. Saudades gostosas. Convite para festa exibido entre sorrisos e gargalhadas.
Neiva está com 52 anos e somente a quatro encontrou com seu sonho: o seu cantinho.
O seu cantinho é uma pequena extensão de terra onde tem um antigo galinheiro que faliu porque o governo do Estado incrementou os juros e com isso afastou os compradores. Que coisa séria... melhor cobrar mais juros que ver o povo progredir!!!!
Tem também uma granja de porcos que as personagens quiseram manter distância porque o cheiro era muito ruim. Apenas olharam os porcos, ouviram a música que tocava para eles. Sim! Os porcos ouvem música para não se assustarem quando os humanos chegam. Não se sabe se eles desenvolveram alguma preferência musical.
Outra espécie de animal que vive naquele cantinho são vaca e bois. Alguns para dar leite, alguns para matar e comer! Que bom!!!
Havia um peru que a menina que se balança correu atrás para fotografar. Cachorros, contei quatro que andavam atrás das personagens.
No caminho havia uma árvore. Bonita. Folhuda. A mulher que erra exclamou: “Um pé de louro!” A convidada a corrige: “É um pé de erva!”
Risos. Tantos risos. A menina que ri, ri mais ainda. A observadora cutuca: “Por isso eu não falo o nome das coisas!”
Antes de chegar no galinheiro falido a mulher que gargalha avisa: “temos uns frangos!” e a mulher que erra, lastimavelmente aproveita para servir de diversão para as demais personagens e solta: “Já tem uns andando soltos por ai!” Eram galinhas... Ora, ora. Ora!!! Mais risos se espalham pelo ar.
Voltemos para dentro da casa, ao redor da mesa.
A mulher que gargalha tão feliz afirma que sua vida dava mesmo um romance. Aos vinte anos ela casou depois de ter ido a uns bailes, a uns jogos de futebol e namorar com o primo do homem que desposou. Vão morar na terra dos sogros no Rio Grande do Sul. São tantas gentes! 12 ao todo. Sogra controladora. Depois de algum tempo vão embora. Vão morar numa fazenda. Trabalham na roça. Lado a lado. Dois filhos chegam. O patrão entra em falência e os manda embora. Vão para Concórdia em Santa Catarina. Trabalha para outras pessoas enquanto cultiva o sonho do seu cantinho.
Uma volta na memória. É uma nadadora. Quando jovem atravessou quatro vezes a nado o Rio Uruguai. E olha que era largo onde fez a travessia. Muito largo.
Mais risos e bolachas.
Agora fala dos filhos. Os dois mais velhos: um menino – aquele que inventou a máquina e a menina – que já é mãe e tem dois filhos, não quiseram estudar.
Suspiro. A mulher que gargalha fica séria e lamenta: “Eu sonhava estudar, mas minha mãe não deixou! Eu tinha de ir morar em Porto Alegre com meus tios. Não pude. Falo para meus filhos: estudem! Aproveitem! Mas também não ‘empurrei’ porque não adianta!”
Volta os olhos para nós, ri e passa a mão pelo rosto: “É, minha vida dava novela.”
Lá nas terras de Concórdia, naqueles tempos, trabalhava com fumicultura porque não dava para enjeitar e havia que se trabalhar com tudo. Trabalhava para os outros.
Mudou-se para muitos lugares: Estreito, Videira, Concórdia e muitos outros lugares que a mulher que lhes apresenta essa história nem conseguiu anotar. Foram tempos difíceis. Mais dois filhos homens chegaram.
Um dos filhos estudou no Colégio Agrícola e outro faz agora o ensino médio em Canoinhas. Não sabe na qual escola. Só sabe que nunca ficou de exame e quer que ele estude mais. Parece que ele deseja fazer administração. Toca gaita, o menino.
***
Para se saber: o menino é bom da cabeça. Desde pequenino era diferente, esperto. Destacava-se de seus primos. Vai fazer faculdade. Ah! Vai.
***
Os tempos difíceis começaram a ir embora quando conseguiram uma carta de crédito para produtor rural e finalmente encontrou seu cantinho em Monte Castelo. Finalmente não vai mais mudar. Realizou seu sonho e outros não há! Deixar eles pro’s filhos.
Sempre trabalhando, fazia pão, queijo, recolhia os ovos, arrumava o leite. O marido vendia.
Sempre deu certo: “Um fazia, outro vendia”
Antes de bicicleta. Depois de lambreta. Por fim um fusca: presente de Deus.
NOTA EXPLICATIVA
Fonte: a mulher que gargalha
Seu marido, apenas ele, cuida do dinheiro e das vendas.
O trabalho braçal, todo ele, ela o faz!
NOTA EXPLICATIVA SUSSURADA
Fonte: a cuidadora
O marido é mulherengo. Bruto. Briga com os filhos. Anda de carro.
Família anda a pé. Agora compraram mais um carro.
***
Recordações sobre tantas idas e vindas, pelas mudanças antes do cantinho. “Tem de ir. Não pode ter medo! Se você não experimentou você não sabe!”
Fim do ato.
ATO Nº 3
As personagens se encaminham para ir embora. A menina que se balança sobe numa balança e se embala ao sabor do vento. Sorri.
Mais fotos no jardim.
Fotos dentro da venda ao som da gaita do filho mais jovem. Aquele que vai ser administrador.
Abraços. Promessas. Voltem.
Voltaremos.
O homem sensual que dirige, nos leva embora. Braços esticados. Acenos.
FIM DE CENA.
Último aviso:
As personagens precisam pensar e analisar. Convidar Michel Foucault para ajudá-las.
CENA 2 - ABREM-SE AS CORTINAS
NA CASA DE LAUDI
A bordadeira
Cumprimentos e abraços. Laudi nos espera na companhia de Celina, a professora.
Uma bróia ou macramé como alguns querem exposta na mesa. Linda. A bordadeira corre buscar outros bordados. Exibe-os com orgulho. Também é costureira.
Conversadora fluente informa que sabe o que as personagens estão buscando porque uma de suas filhas fez uma pesquisa sobre sexualidade das mulheres. Brilham-lhe os olhos. É bonita. Cabelos tingidos, pele lisa para seus sessenta e seis anos.
UM DESTAQUE
Realiza-se nas filhas.
Orgulho e paz familiar
Descobrimos logo que Laudi é ‘rica’. Tem terrenos alugados, costura e borda e tem seu próprio dinheiro. Agricultora sim. Com sua própria terra sempre teve seu cantinho. Dinheiro sobra para ajudar suas filhas que são todas pós-graduadas. São 6. Uma mora no Piauí com um neto que ajudou a criar e para o qual destina amor e dinheiro.
Celina – a professora – escuta e fala. É aposentada a professora. Deu aulas em salas multisseriadas e sempre teve ajuda de empregadas para criar suas duas filhas. O marido ajudou-a sempre. Trocava fraldas e levava as meninas ao médico.
Viveu sempre no interior e mudou-se para a cidade para suas filhas estudarem. Não se acostuma na cidade.
A conversa segue tranqüila ao redor da mesa quando, de repente, uma visitante inesperada aparece no vão da porta. Convidada pela bordadeira a entrar e sentar-se fora da roda. Senta-se com pernas muito magras juntas e sobre elas as mãos que se agitam.
Calada por poucos minutos consegue um banquinho e não se sabe com que rapidez entra na roda. Interfere e começa a contar sua vida. Casada e descasada com caminhoneiro, quatro filhos e depois mais quatro! Maldiz seu casamento desmanchado pela ‘outra’.
Fala ininterruptamente. Conta que estudou até quarta série e que subia nos banquinhos para alcançar o quadro negro onde ensinava, ela mesma, para os coleguinhas maiores.
As personagens, a professora e bordadeira escutam suas histórias. Fala de sua primeira comunhão num dia que chorou por estar calçada de alpargatas enquanto as outras meninas estavam de sapatos brancos bonitos.
Na contradição da inexperiência e confusão de memórias afirma que vendo-a chorar uma senhora fez um bilhete e mandou-a à uma loja onde ela ganhou uma meia três quartos com um pomponzinho branco pendurado e sapatos novos. Diz que volta para a fila da primeira comunhão sorrindo faceira.
NOTA EXPLICATIVA
As personagens não entenderam como isso tudo aconteceu enquanto a fila de crianças andava pela igreja em busca da primeira hóstia.Havia de ser milagre.
A BORDADEIRA PERGUNTA
Com testa franzida:
“Mas, e deu tempo para ir e voltar enquanto a fila andava?”
Mãos agitadas, palavras desconexas. Foge do assunto como esquilo assustado!
Agora é importante falar das goteiras que lhe invadem a casa nos dias de chuva. Pobreza. De bens e de atenção.
Os filhos não valorizam a escola. Ganham tudo. Uniforme. Cadernos. Livros. Nada disso tem valor porque não sabem o que é não tê-los. É o que diz!
Monopolizante.
Fala sobre uma cirurgia de apendicite. Doía muito. 13 médicos ao seu redor rezavam por ela. Abriram um ‘talho na sua barriga que ia do umbigo até o meio dos seios’.
COMENTARIO DA PERGUNTADORA:
Bizarro!
COMENTÁRIO DAQUELA QUE APRESENTA A HISTÓRIA
Quem pesquisa memórias de gente há de ser capaz de filtrar a veracidade dos fatos enquanto respeita o contador de memória.
***
Silêncios que falam. Comentários dispensados. Quebra do silêncio quando a observadora volta-se para Celina e começa a lhe fazer perguntas sobre sua vida.
***
Celina lastima que as suas duas filhas queixosas lhe cobram não ter participado mais de suas vidas.
A visitante inesperada diz que a prosa “ta boa” mas que precisa ir embora.
Água de poço. Gostosa.
A menina que ri levanta-se e sozinha abre o armário para buscar mais copos. Pegou confiança, a menina!
Dos sonhos da bordadeira apenas um: ir a praia. Passa o ano esperando ficar um tempo curtindo a praia.
Celina, sem sonhos concretos, se agarra ao outro sonho e diz que passará a sonhar ir para praia conhecê-la, junto com a bordadeira. É claro!
É tempo de irmos embora.
As personagens se vão, não sem antes tirar fotos com a promessa de enviar copias para as convidadas especiais.
Adeuses.
O homem sensual que dirige conduz ao retorno as personagens.
DA GARIMPAGEM:
A abastança
O cantinho do sonho
A mágoa das filhas
A memória distorcida
O dinheiro
Os maridos não materializados na fala. Quem são?
Da projeção do desejo na carne dos filhos.
A miséria e a pobreza.
Os sentidos das personagens.
Fim. Por enquanto.
sexta-feira, 30 de outubro de 2009
segunda-feira, 26 de outubro de 2009
domingo, 25 de outubro de 2009
Iniciando a conversa...
Estou iniciando essa página com muitos planos.... pensar em educação, na formação dos educadores e em informar ...
Para isso convido a todos para deixarem comentários, sugestões, palpites...
Sintam-se a vontade e muito bem vindos.
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